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revira


Com uma ponta de resignação pegou o único objeto que lhe pertencia naquela mesa e pos-se a caminhar. Era sempre com essa cena que fechava seus dias durante as semanas. Pegava as chaves e saia. Não se  importava em dizer um "Boa tarde", ou um "Até amanha", sabia que ninguém ali lhe queria bem, e por  consequencia, também não queria bem a ninguém.

Era março, tudo fazia juz à canção "São as águas de março fechando o verão", os pingos embaçavam seus  óculos, se tirasse corria o risco de não entrar no local correto, a visão era um problema desde os  cinco anos, quando colocou o primeiro aro em seu rosto. Ainda o mantinha na gaveta perto da cama, o  porque não sabia. Os passos eram mecânicos, não corria como todos os demais nas ruas, maninha o mesmo  rítimo programado, contidiano como os atos, esperando que no próximo minuto a familiar gota de suor lhe  escorresse  pelas costas e, como sempre, pensasse em como trabalhar próximo de casa seria mais cômodo.

Completou as duas voltas para destrancar a porta, o cenário a sua volta não agradava os olhos, por isso  sempre depositava os óculos na mesa ao lado da porta, onde também ficavam a pliha de papeis entregues  pelos correios e o outro objeto que transportava sempre que precisava sair. Mecamicamente, caminhou até  a geladeira, destampou a garrafa e despejou o líquido no vidro. Agora era hora de voltar para aquela  capa de tristeza que quase sempre esperava na casa. Aquela que apesar de disfarçar, sempre voltava com  força e golpes de mestres.


Em posse da tristeza que lhe era sua por direito, jogou as roupas junto ao resto da pilha no canto com  azulejos e preparou-se para a ducha fria, era hora de formatar o resto da história. Com os pigos  chocando seu copro, lebrou daquela tarde onde largara tudo que disseram ser seu, jogara três ou quatro  objetos na mochila e partiu para aquela nova vida. Vida que agora já estava batida, absorvida pelos  horários marcados, pelos compromissos impostos, pelo vazio daquela cidade. Ainda não sentira que a nova  vida realmente começara. Esperava.

A fraca luz da rua tentava descobrir o que havia naquela casa, adentrava brandamente pela fresta  entreabarta da janela e procurava meios de se dispersar, porém era toda absorvida pelos detalhes  escuros da decoração. Qualquer um que entrasse ali de dia acharia que era uma casa abandonada, daquelas  que assustam nos contos de terror. Móveis antigos, empoeirados, é claro, quadros abstratos de mais,  tudo refletia a espera de uma modificação, algo urgente mas que ainda não estava nos planos da  inquilina.

Saída do banho, hora de revirar na cama fria à espera do sono. Sono esse que quase nunca aparecia como  se podia verificar na outra pilha de livros que se formava ao lado da cama. Sentou-se no colchão gasto,  acendeu a luz que ficava em cima da mesa de cabeceira e começou a ouvir o silêncio. Silêncio que durava  pouco, cerca de cinco minutos,  logo era interrompido, um choro forte de criança. COmo choro de  criança, pensou: não existe nenhuma criança nesta área.

O choro continuava, forte, agudo. Ele começou a desconfiar que começava a ser engolido pela própria estória. Apertou o botão Sair, desligou o monitor, e foi acudir o bebê no andar de cima.

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